Quando Tite anunciar os 23 jogadores que irão à Copa do Mundo da Rússia, às 14h desta segunda-feira, em transmissão ao vivo da TV Globo, do SporTV e do GloboEsporte.com, é bom que o público saiba: a lista não é só dele. A convocação da seleção brasileira é feita a pelo menos 18 mãos, num processo que envolve estratégias, busca por aliados e discussões calorosas numa sala do segundo andar do prédio da CBF, no Rio de Janeiro.
Lá fica o departamento de seleções na sede da entidade. Tite é o comandante, tem a decisão final, o poder de carimbar o passaporte de cada um que lutará pelo hexa. Mas, antes, ele ouve atentamente cada um de sua comissão. E pergunta. Debate. Combate. É como se o técnico fosse a banca e os demais defendessem teses em busca da aprovação.
Há seis interrogações: no gol, nas duas laterais – duas no lado direito e uma no esquerdo –, na zaga, e uma do meio para frente, que pode ser ocupada por um volante, um meia ou um atacante. A expectativa é que o anúncio confirme as inclusões de Fred, do Shakhtar Donetsk, e Douglas Costa, da Juventus, junto aos 15 nomes já definidos desde o ano passado (eram 16 até a lesão de Daniel Alves).
– Tite também tem uma argumentação muito forte e usa a estratégia dele. Sozinho, é difícil de ele nos vencer, mas se tiver um do lado dele, consegue. Tu trabalha como se fosse um lobista, eu falo para os outros: não se abre para ele que ele vai querer te levar (risos).
A frase é de Cleber Xavier, auxiliar e braço-direito de Tite há 17 anos. Além dele, participam dessas reuniões os três membros do CPA (Centro de Pesquisa e Análise), Fernando Lázaro, Matheus Bachi (filho de Tite) e Thomaz Araújo, e o coordenador Edu Gaspar.
Os dias que antecedem as convocações transformam o segundo andar em um centro de lobistas. De olho nas preferências alheias, membros da comissão técnica buscam aliados, aqueles que ainda têm algum tipo de dúvida, para ajudarem a defender sua tese. Estratégia.
Dessa vez, na laboração da mais importante das listas, Sylvinho também estará presente. O auxiliar mora na Europa e costuma participar por conferência. As opiniões do preparador de goleiros Taffarel – uma das vagas abertas é na posição – e do preparador físico Fábio Mahseredjiantambém serão consideradas – muitos jogadores tiveram lesões em momentos do ano.
– É um trabalho de convencimento do que observamos. Cada um passa sua ideia e defende qualidades e defeitos dos atletas em cima da nossa ideia de futebol. Por mais que feche o pau de vez em quando, todo mundo se abraça quando decide-se por um. Esgotamos ao máximo nossas tentativas – conta Matheus Bachi.
Essa é uma regra de boa vizinhança. Ninguém pode reclamar depois. Se um convocado cometer um erro, é absolutamente proibido aquele tipo de lembrete “eu avisei para chamar outro”. A comissão técnica se fecha em prol dos escolhidos, mas sem perder o bom humor.
A relação com Tite, e principalmente entre os auxiliares, é divertida. Fazem brincadeiras com as preferências de cada um, provocam, fruto do enorme tempo que passam juntos e da permissão dada pelo treinador para que participem ativamente do processo de convocação.
– Não conheço um cara que se aproxime do Tite na questão de descentralizar e valorizar a opinião do outro. Mesmo o Thomaz, que conhecemos agora, o que ele diz e pensa tem o mesmo valor – acrescenta Cleber Xavier.
Bonzinho? Nem tanto. O técnico exige uma contrapartida para envolver tanta gente assim na escolha de seus jogadores: a qualidade dos argumentos. Quem chegar despreparado à reunião será absolutamente engolido por Tite na defesa de um atleta.
– Não tem peso quem está falando, as ideias é que são consideradas. Ganha o melhor argumento, não importa de quem seja. Claro que a palavra final é do Tite, e ao mesmo tempo que ele dá essa liberdade, nos dá autonomia para expor ideias, ele é muito crítico. Não vá falar qualquer coisa. Ele faz com que cada um se prepare muito bem – valoriza Fernando Lázaro, coordenador do CPA e parceiro de Tite nos importantes títulos conquistados pelo técnico no comando do Corinthians.
As observações finais foram feitas no último fim de semana. Como sempre acontece, um grupo de WhatsApp movimentou vídeos, fotos e impressões que mais chamaram atenção. É o que a comissão técnica da Seleção chama de democratização da informação, e que norteou as convocações nos últimos dois anos. Em algumas horas, Tite será o porta-voz da escolha que todos esperavam: a dos 23 nomes que tentarão o hexa e um lugar na história do futebol.
Por: Alexandre Lozetti e Edgard Maciel de Sá, Rio de Janeiro, G1