O mês do São João começa nessa sexta-feira (1º) e muitas cidades baianas se preparam para receber um número de turistas até três vezes maior do que a quantidade de seus habitantes.
Na contramão de seis municípios do estado que cancelaram a festa depois do impacto da greve dos caminhoneiros, outros cinco já contam os dias para os festejos juninos. Neles, os turistas extrapolam a quantidade da população local, e nem a redução nos investimentos está tirando o brilho do evento, como asseguram os organizadores.
Com uma população de 84 mil habitantes, Senhor do Bonfim, no Norte do estado, já chegou a reunir 250 mil pessoas em seu São João. Para este ano, a prefeitura reduziu o investimento na produção da festa em 30%, segundo o secretário de Cultura da cidade, Rodrigo Wanderley. Mas nem por isso a cidade vai deixar de ser um dos destinos mais procurados do estado, assegura o gestor.
“Mantemos o tamanho da festa, mesmo com a redução de cachês. A gente não consegue contratar um sertanejo por menos de R$ 300 mil. Tentamos encaixar a grade dentro da realidade financeira do município. Vai ser com muita dificuldade, mas vamos fazer”, diz ele. Entre as atrações estão Flávio José, Adelmário Coelho, Dorgival Dantas e Tayrone Cigano.
Em Santo Antônio de Jesus, no Recôncavo, a redução nos recursos investidos será de 10%, segundo a secretária municipal da Cultura, Turismo e Juventude da cidade, Denilce Conceição Côrtes.
Mesmo assim, segundo ela, “as pousadas já estão praticamente fechadas e ainda há o pessoal que aluga as casas”, o que costuma ser um bom negócio para os moradores. A cidade de 103 mil habitantes espera receber cerca de 100 mil pessoas por noite, em cinco dias de festa.
O prefeito de Amargosa, Júlio Pinheiro (PT), também confirmou a queda nos investimentos para o São João 2018. Só não divulgou quanto. “Houve redução de investimentos, mas de forma que não impacta na qualidade do São João e no peso das atrações. No ano passado, já fizemos uma avaliação e estabelecemos cortes nos custos”, disse ele. Pinheiro afirma que parte da estrutura e da decoração da festa na Vila Amargosa é reaproveitada de anos anteriores.
A cidade, de 38 mil habitantes e que fica no Centro-Sul da Bahia, vai contar com atrações gratuitas como Elba Ramalho, Flávio José, Henrique e Juliano, Estakazero, Daniel Vieira, Seu Maxixe e Gabriel Diniz. Vai ter ainda o tradicional Forró do Piu-Piu para pagantes. A expectativa é atrair 80 mil turistas para os festejos.
Explicações
Em comum, o motivo das reduções no valor da festa: as baixas arrecadações dos municípios neste ano, acentuadas, recentemente, pela greve dos caminhoneiros. Sobre os investimentos, o Ministério Público (MP-BA) recomenda que as comarcas municipais fiscalizem as contratações irregulares, sem licitações, e aquelas com cachês altos demais para o porte das cidades.
Em Cruz das Almas, no Recôncavo, há risco de o evento sofrer alterações parciais ou totais, segundo informou o vice-prefeito, Max Passos, responsável pela organização da festa, também devido ao impacto financeiro causado pela greve dos caminhoneiros. A cidade decretou estado de emergência na última segunda-feira (28) e teve de cancelar dois eventos previstos para ontem e anteontem. Não aconteceram o Esperando o São João e o Arrasta Pé Junino.
“Continuamos trabalhando e terminando de montar o espaço da festa. Mas, na semana que vem, vamos avaliar medidas a serem tomadas, tendo em vista a queda de arrecadação do município, com a diminuição prevista de 30% do Fundo de Participação dos Municípios (FPM)”, disse Max Passos.
Apesar disso, estão confirmadas atrações como Elba Ramalho, Alceu Valença, Alcymar Monteiro e Flávio José. Os hotéis da cidade já estão com lotação de mais de 80%, segundo estimativas do vice-prefeito. A gestão municipal de Amargosa investiu mais de R$ 1 milhão no Arraiá de Cultura Popular.
Em Euclides da Cunha, o Arraiá do Cumbe, organizado pela prefeitura local, deve atrair ao sertão baiano entre 60 mil e 80 mil pessoas por dia, segundo estimativas da organização do evento.
As atrações principais da festa, que ocorre entre os dias 22 e 25 deste mês, são Aviões do Forró, Adelmário Coelho, Flávio José, Calcinha Preta e Magníficos. Apesar de afetada também pelas manifestações dos caminhoneiros, a cidade manteve os festejos juninos, que são a principal fonte de renda na cidade.
Ocupação
A procura por hotéis, pousadas e casas para aluguel já é intensa na cidade de 62 mil pessoas. “Estimamos que cerca de 80 hotéis estejam já lotados”, disse o coordenador da festa, Miguel Ângelo Dias Ferreira. O Mirante Hotel é um dos que ainda tinham vagas ontem. “Para casal, custa R$ 1.000 os quatro dias, e para solteiro R$ 700”, informou o atendente Leandro Santana.
Muitas pessoas já estão em busca de casas para alugar. Os preços variam entre R$ 1.200 a R$ 2.500, a depender do tamanho e da quantidade de pessoas. As casas, mobiliadas, são alugadas por um grupo de, no máximo, 12 pessoas.
“Tem muita demanda para pouca oferta. Já despachei três grupos, porque eles estão em 15 pessoas, e não tenho casa para tanta gente”, contou uma mulher que atua como uma espécie de agenciadora de aluguel e não quis ter o nome revelado. “Já fechei contrato de dez casas, três delas de parentes meus. As outras são de conhecidos”, completou.
UPB aconselha a não cancelar eventos
Valença, Santa Cruz Cabrália, Porto Seguro, Eunápolis, Simões Filho e Camacã foram algumas das cidades que cancelaram o São João depois dos efeitos da greve dos caminhoneiros que durou dez dias.
Por conta das baixas arrecadações dos municípios neste ano, acentuadas, recentemente, pela greve dos caminhoneiros, a realização de alguns arraiás ainda é incerta. De acordo com a União dos Municípios da Bahia (UPB), em Porto Seguro, no Sul do estado, a festa foi cancelada e alguns prefeitos não conseguiram fazer a inscrição para receber a ajuda de recursos do governo estadual, para a execução dos eventos.
“Tem cidades cancelando, mas a gente aconselha a não cancelar. Sabemos que o município teve uma queda de receita grande, mas o São João não é um gasto, é um investimento. Para cada R$ 1 gasto com a festa, circula de R$ 8 a R$ 10 no município. É uma oportunidade que temos de movimentar a economia local. E a festa pode ser feita adaptando os custos para a realidade regional”, explica Eures Ribeiro, presidente da UPB.
O secretário de Cultura de Bonfim, Rodrigo Wanderley, espera ter esse retorno com o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Cerca de 30% a 40% do investimento da festa vêm de patrocínio do comércio local, bancos e cervejarias.
“Não dá para cobrir 100%, mas pelo volume de recursos que entra no bolso do município, vale a pena para a economia local. Aquece a economia de forma geral. A feira da cidade bomba. Tem gente que chega a vender 600 buchadas em um dia na feira. Várias famílias saem de suas casas para alugar”, explica.
Gustavo Almeida, de Bonfim, conta que chega a faturar R$ 6 mil alugando a casa, de três quartos, para até 15 pessoas. “Os hóspedes precisam trazer colchão”, diz.
Por: Nilson Marinho*, Raquel Saraiva* e Mário Bittencourt