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Empresas e produtores reclamam da alta de custo com a decisão da ANTT

A greve dos caminhoneiros que parou o país por mais de uma semana parecia pacificada, mas o ponto final dessa disputa entre transportadores e empresas contratantes de serviços ainda está longe do fim. Uma das reivindicações da categoria era que o governo adotasse uma regra que garantisse uma remuneração mínima pelas viagens, calculada com base no tipo de transporte e no quilômetro rodado.

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As tabelas de frete foram publicadas pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) em 30 de maio e ajudaram no fim das paralisações, já que atendiam a uma das reivindicações dos transportadores. O problema é que as novas regras impactaram de uma hora para outra no aumento de custo de transporte e, por consequência, no custo total de produtores dos mais diferentes setores da economia. Agora, com os problemas apontados pela indústria e o agronegócio, a agência trabalha na revisão dos valores.

Por conta da alta dos custos de frete, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) entrará hoje com um mandado de segurança para que seus associados não tenham de cumprir a portaria da ANTT. Segundo José Ricardo Roriz Coelho, presidente em exercício da entidade, o governo, apesar de ter sido obrigado pela situação a reagir com rapidez, não deveria ter “tomado uma decisão de afogadilho como aconteceu”.

Segundo Roriz, as empresas ligadas à federação apontaram altas no frete que variaram de 30% a 150%. “Isso é totalmente fora da realidade de mercado. A demanda atual é muito baixa e as empresas ainda sofrem os efeitos da greve. Com esse tabelamento, o aumento de preço será inevitável e quem pagará a conta será o consumidor”, adverte.

O presidente da Fiesp lembra que em um momento em que a inflação do país, anualizada, oscila entre 3,5% e 4%, não há espaço para repassar uma alta de preço dessa proporção. Roriz afirma que políticas de tabelamento com o objetivo de controle de preço foram usadas durante o período de hiperinflação do país. “Não faz sentido querer que a Petrobras pratique o preço de mercado enquanto para os fretes vale o controle de preços. Algo precisa ser feito”, critica.

Como resultado da decisão da ANTT, que foi amplamente apoiada pelo Palácio do Planalto, setores ligados ao agronegócio colocaram o pé no freio e passaram a cumprir apenas contratos inadiáveis. Foi a forma encontrada para ganhar tempo e tentar negociar junto ao governo outras regras para o frete. A estratégia, que contou o apoio público do ministro Blairo Maggi, da Agricultura, deve ter resultado com a revisão dos valores previstos na tabela da agência.

Ministro

Ontem, assim que deixou o evento em que foi anunciado o Plano Agrícola e Pecuário 2018/2019, Maggi reclamou do tabelamento. “Esse negócio ficou fora de qualquer padrão. Subiu duas, duas vezes e meia o mesmo frete trabalhado antes da greve. Quem vai acabar pagando a conta é o consumidor, com inflação violenta que vai vir pela frente. Não pode, em um momento desses, desequilibrar todo o resto da economia em função de uma determinada categoria”, alertou em conversa com jornalistas.

A crítica de Maggi ao tabelamento do frete mínimo contou com o apoio de entidades ligadas ao agronegócio, que lembram que a indústria é quem tem assumido essa alta dos custos. Segundo a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), as tabelas de frete trazem uma série de distorções e são genéricas. Ricardo Santin, diretor da entidade, acredita na possibilidade de haver um erro nos dados publicados, já que o frete da mercadoria a granel tem um valor maior do que o de produtos perigosos (veja quadro), o que contraria a lógica que prevalecia no mercado até a nova regra entrar em vigor.

“Entendo que havia uma urgência para resolver o problema da greve, mas agora é importante que possíveis falhas sejam revistas, que a cadeia produtiva participe das discussões e que haja tempo para nos adaptarmos a essas mudanças”, explica. Santin lembra ainda que a indústria terá de arcar com o aumento de custo do que já foi comprado. Pela portaria, quem não cumpre a tabela de frete deverá pagar em dobro a diferença entre o que foi acertado e o que determina a ANTT.

Além da diferença entre os tipos de frete, Santin aponta outros problemas nas tabelas de referência para o pagamento das viagens feitas pelos caminhoneiros. Segundo ele, a Resolução nº 5.820, de 30 de maio de 2018, que instituiu a Política de Preços Mínimos do Transporte Rodoviário de Carga, não prevê situações em que um caminhão faça a viagem de ida, carregado e frigorificado, e volte vazio, ou como diz Santin, “cheio de vento”. “Não dá para ser o mesmo valor para as duas viagens”, diz o representante da ABPA.

Outro exemplo é o de pequenos caminhões que fazem entregas urbanas. “Se o veículo sai para fazer várias entregas em pequenos supermercados, como será o cálculo para o frete? Um valor único ou um preço para cada trecho?”, questiona. Para a cadeia da proteína animal, as tabelas de frete terão um impacto estimado entre 25,3% e 60%, dependendo do tipo de produto, distância percorrida pelo caminhão e ICMS do estado onde o transporte for feito. Odacir Zonta, consultor da ABPA, diz que a entidade trabalha com a possibilidade de, caso não consiga negociar com a ANTT, recorrer a medidas legais. “Afinal, como a agência chegou a esses valores”, questiona. Esse aumento de custo, segundo Santin, será repassado para o preço final dos produtos.

No campo

Na Confederação Nacional da Agricultura (CNA), a tabela de frete tem sido acompanhada com muita atenção. Elisangela Pereira Lopes, assessora técnica da Comissão Nacional de Infraestrutura e Logística, conta que o impacto nas despesas dos produtores é grande. Ela dá como exemplo o transporte de grãos entre Sorriso (MT) e Santos (SP), que tinha um frete de R$ 290 a tonelada e agora, com o tabelamento, passou a R$ 437,55. Se o caminhoneiro voltar para o seu destino sem carga, com o caminhão vazio, o contratante terá de pagar o frete retorno, o que elevará a conta para R$ 748.

“Já começamos a ouvir alguns produtores falando em se associar para ter a própria frota. Isso vai ter um impacto entre os caminhoneiros, porque haverá uma demanda menor. Há casos ainda de produtores que simplesmente estão diminuindo o escoamento de produtos porque não sabem como absorver esse custo do frete que não estava previsto”, detalha a assessora da CNA.

Elisangela não acredita na eficiência das tabelas de frete. Ela lembra que atualmente a oferta desse tipo de prestação de serviço é muito maior que a demanda. Além disso, a ANTT não tem condições de fiscalizar tanto o valor pago pelos contratantes quanto as condições de viagem de volta dos caminhoneiros para saber se estão com as carrocerias vazias e devem receber o frete retorno. “Infelizmente essa tabela não considerou o usuário do transporte. O trabalho foi feito em cinco dias e pulou várias etapas do processo, como a consulta e as audiências públicas, levando em consideração apenas a demanda dos transportadores”, diz a representante da confederação.

Procurada, a ANTT informou por meio de nota que a revisão da tabela de fretes vem sendo discutida “com prioridade” desde a semana passada e que em breve publicará os ajustes e dados mais detalhados que “vão esclarecer as possíveis dúvidas”. Ao contrário do que foi feito na primeira versão dos números, a agência pretende abrir um processo de consulta pública assim que as novas regras entrarem em vigor para que os envolvidos no processo possam participar com contribuições.

Na carroceria
Exemplos de preço para o frete

Viagem de 2.901 km a 3.000 km

Tipo de carga     Custo por km/eixo (R$)
Carga geral    0,88
Carga granel     0,89
Carga neogranel     0,79
Carga frigorificada     0,63
Carga perigosa    0,57

Por: Paula Pacheco