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Mulheres quilombolas em São Mateus criam empresa de artesanato e fazem vendas online

 

Não há real que nunca tenha sido imaginado. Foi com esse pensamento que a jovem Milena de Faria, de 26 anos, conseguiu mudar a vida dela e de outras mulheres da comunidade Quilombola Nossa Senhora da Penha, no município de São Mateus, no Norte do Estado.

Dona de um coração persistente, atado em sonhos infindos, Milena nunca deixou de acreditar. Quando menina, aos sete anos de idade, traçou o objetivo: aprenderia a ler para ensinar a mãe.

O idealizado na sala de aula da pequena comunidade, distante 219 quilômetros da capital Vitória, impulsionou a jovem a sonhar de forma coletiva. Aos 14 anos, Milena percebeu que a falta de tempo, era também o fator que contribuía para que as mulheres da localidade não fossem alfabetizadas.

Sem emprego formal ou renda fixa, a maioria ganhava a vida no duro trabalho do campo. Plantar, arar a terra, esperar o tempo da colheita sob o sol senegalês que arde no Norte, deixava todas consumidas.

“A vida aqui na roça é muito difícil. Não tem trabalho de limpeza ou faxina como acontece na cidade grande. Aqui, o trabalho é na enxada, de campina mesmo. Faça o tempo que for. É tudo muito cansativo”, narra dona Marolina Áries, idosa de 68 anos, nascida e criada na Comunidade Nossa Senhora da Penha.

Ao vivenciar o que parecia destino de quem nasce no chão árido, craquelado pelas chuvas escassas, Milena resolveu que era hora de ressignificar as histórias de quem ali já estava e oportunizar uma vida diferente para quem vai chegar. Por isso, há cerca de dois anos, ela criou a Associação Pérolas de Cor. O grupo de 21 mulheres Quilombolas produz chinelos, tiaras, pulseiras e sousplat (acessório de cozinha com um nome de origem francesa que serve como uma base para colocar os pratos na mesa).

“Há dois anos conseguimos inscrever o nosso projeto em um edital. No início, a ideia era bordar chinelos, fazer pulseirinhas. Mas na hora da inscrição coloquei que também faríamos crochê. Fizemos todo o processo do edital e aguardamos o resultado. Foi pura ansiedade”, se diverte Milena ao lembrar.

A espera foi rápida e, no final do ano passado, veio a aprovação. O Pérolas de Cor participou do edital lançado pela multinacional Suzano, maior produtora global de celulose de eucalipto. O objetivo é apoiar projetos desenvolvidos pelas comunidades quilombolas com foco para a geração de renda.

Em atividade desde 2021, o Pérolas de Cor gerou uma cadeia de empreendedorismo. Atualmente, o trabalho é desenvolvido por várias gerações.

São mães que atuam ao lado das filhas, netas que auxiliam e compartilham conhecimento ao lado de avós.

O contato diário entre elas é repleto de risos e trocas. Como se um fio invisível de expansão, abertura e generosidade fosse tecido pela mão de muitas mulheres.

A trama bordada dos chinelos, das pulseiras e das tiaras, se une e cria vínculos apertados. O resultado final é visto e comercializado em feiras de artesanatos e na internet, uma “terra” nova que as mulheres querem cultivar.

“A internet ajuda bastante. Temos produzido muito e postado todos os itens. Assim que o pedido é feito por lá, confeccionamos o que foi solicitado e enviamos pelos Correios”, diz Milena, presidente da Associação Pérolas de Cor.

O perfil do empreendimento nas redes sociais faz sucesso. Nele, tudo o que é construído na comunidade é retratado em fotos e vídeos.

A página também é usada para encomendas. É por lá o contato principal para pedidos e envios das peças. Em 2022, o plano das empreendedoras é produzir outros acessórios. Com a vida mudada para melhor, elas afirmam que é tempo de sonhar outros mundos possíveis. Para Milena, mudar as coisas é o que interessa mais.

“Sonhamos em ganhar o mundo. Desejamos que a nossa arte seja vista e consumida por todas. Quem sabe até mesmo vender os nossos produtos para outros países?”.

// Folha Vitória