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Clube do Bolinha: 72 cidades baianas não elegeram mulheres para as Câmaras de Vereadores

Era 1928, quatro anos antes de as mulheres terem o direito de votar no Brasil, mas uma figura feminina chamou atenção no interior do Rio Grande do Norte. Alzira Soriano, com 32 anos na época, foi eleita a primeira prefeita do país graças a uma lei estadual que permitiu sua candidatura. Quase cem anos depois, não há impedimentos oficiais para que mulheres sejam eleitas. As candidaturas, no entanto, ainda esbarram no machismo e estão longe da equidade. Prova disso é que mais de 70 cidades baianas não elegeram sequer uma mulher para a Câmara de Vereadores na eleição municipal deste ano.

O levantamento foi feito pelo CORREIO a partir dos resultados da eleição divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Entre todos os 417 municípios baianos, 72 não elegeram mulheres para cargos no Legislativo. O número representa 17,26% de todas as cidades do estado. Fazem parte das funções dos vereadores eleitos elaborar as leis municipais e fiscalizar a atuação do Executivo.

Entre as cidades baianas em que vereadoras não foram eleitas estão Barra da Estiva, Itacaré, Medeiros Neto, Simões Filho e Remanso (veja a lista completa abaixo). Os municípios são, em sua maioria, de pequeno e médio porte, e são localizados em todas as regiões do estado. Para a cientista política Alessandra Maia, que pesquisa o tema, a representatividade política feminina avança com o passar dos anos, mas o processo ainda é lento.

“A presença política sempre foi almejada pelas mulheres, o que não foi permitido até pouco tempo atrás no Brasil. Por isso, a entrada das mulheres na política é dificultada, especialmente em cidades menores”, analisa Alessandra Maia, professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). “Apesar de serem 51% da população do Brasil, o percentual de mulheres eleitas varia entre 10% e 30% nas cidades do país”, completa a professora.

Outro fator observado pela cientista política é o fenômeno das candidaturas femininas atreladas a figuras masculinas. Diversas vereadoras baianas se elegeram neste pleito com nomes ligados ao de homens. É o caso de Tanhaçu, cidade de 21 mil habitantes no centro-sul baiano, onde apenas uma vereadora foi eleita. Trata-se de Elisângela Albina Silva Aguiar, eleita como Li De Leandro, pelo Solidariedade. Ela recebeu 633 votos.

Já em Serra Dourada, no oeste, Cleci De João Do Zelão, nome político de Cleci Souza da Costa, foi eleita pelo Partido dos Trabalhadores com 837 votos. Quem também se elegeu no município foi Dinha De Dona Emília, pelo União Brasil, com 598 votos. Uma reportagem do CORREIO revelou que câmaras municipais na Bahia têm apenas uma mulher a cada dez vereadores. 

“As mulheres, muitas vezes, entram nesse meio porque têm parentes na política ou porque são casadas com políticos. O Brasil vive um processo em que é importante valorizar o voto em mulheres e, além disso, que elas alcancem votos pela sua trajetória e não por serem apenas apadrinhadas”, diz Alessandra Maia, que analisou o assunto no artigo Mulheres como outro na política brasileira.

A cientista política Cristiane Bernardes é assessora técnica do Observatório Nacional da Mulher na Política (ONMP), em Brasília. Nos últimos meses, Cristiane recebeu relatos de candidatas que buscaram o observatório para acolhimento psicossocial. Os obstáculos relatados por elas vão desde falta de condições materiais e financeiras até dificuldade em cuidar dos filhos durante o período de campanha.

“Muitas das que concorrem vêm de famílias com políticos. Isso acontece porque é uma forma que elas encontram de criar redes e terem mais apoio das pessoas próximas. Em geral, vemos que as mulheres entraram na política institucional com idade mais avançada justamente porque levam mais tempo para acumular algum tipo de capital, seja econômico ou de relações”, avalia Cristiane Bernardes.

Para garantir o equilíbrio de candidaturas no Brasil, a legislação eleitoral exige que partidos políticos assegurem um mínimo de 30% e um máximo de 70% de candidaturas de cada sexo. Apesar disso, as cotas de gênero nem sempre são respeitadas. Um estudo do Observatório Nacional da Mulher na Política revelou que a lei não foi respeitada em 772 municípios brasileiros na eleição deste ano. Destes, 72 são baianos.

Representatividade segue igual na capital

Das 43 cadeiras da Câmara de Vereadores de Salvador, apenas oito serão ocupadas por mulheres a partir do próximo ano. O número segue o mesmo da legislatura atual e representa 18,6% das vagas. A vereadora reeleita Roberta Caires, do União Brasil, foi a mais votada entre as mulheres, com 16.517 votos. Ela foi a sexta com mais votos para o cargo entre todos os candidatos.

São raros os casos em que as casas legislativas são compostas por mais mulheres do que homens. Em geral, quando são eleitas, as candidaturas femininas são únicas ou têm, no máximo, outras duas colegas. Uma exceção é Rodelas, cidade de 9,4 mil habitantes. Das nove cadeiras para a Câmara Municipal, cinco serão ocupadas por mulheres. Foram eleitas Suenia de Galeguinho (União), Ana Nery (Avante), Fabiana de Nestor (PSD), Ivany de Niaka (PC do B) e Jussara de Firmino (PSD).

A primeira prefeita brasileira

A vitória de Alzira Soriano, eleita prefeita de Lajes, no Rio Grande do Norte, em 1928, foi parar até no jornal americano The New York Times. O feito foi inédito: mesmo em um país onde o voto feminino não era permitido, a candidata se tornou a primeira gestora municipal do Brasil. O sufrágio para as mulheres só foi permitido após a promulgação do Código Eleitoral, em 1932, pelo presidente Getúlio Vargas.

Alzira Soriano só pôde se eleger graças a uma lei estadual assinada um ano antes do pleito, em que o governador José Augusto Bezerra de Medeiros permitiu a entrada de mulheres na disputa eleitoral. O voto, na época, era indireto. Apesar de ter sido convidada para permanecer como interventora após a Revolução de 1930, ela renunciou ao cargo por não pactuar com o governo.

Aldamira Guedes Fernandes foi a primeira mulher eleita prefeita por voto direto no Brasil, em Quixeramobim, no Sertão Central do Ceará, no ano de 1958. Ela faleceu em 2013, aos 89 anos.

Cidades baianas que não elegeram mulheres nas Câmaras de Vereadores

  1. Acajutiba
  2. Aporá
  3. Barra da Estiva
  4. Barra do Rocha
  5. Barro Alto
  6. Barrocas
  7. Boa Nova
  8. Boninal
  9. Boquira
  10. Caatiba
  11. Caculé
  12. Caetanos
  13. Caetité
  14. Cairu
  15. Capela do Alto Alegre
  16. Carinhanha
  17. Caturama
  18. Conde
  19. Coração de Maria
  20. Coribe
  21. Dário Meira
  22. Filadélfia
  23. Firmino Alves
  24. Gavião
  25. Heliópolis
  26. Iramaia
  27. Iraquara
  28. Itacaré
  29. Itaeté
  30. Itagibá
  31. Itaju do Colônia
  32. Itamari
  33. Itanagra
  34. Itarantim
  35. Ituaçu
  36. Jaguarari
  37. Jandaíra
  38. Jiquiriçá
  39. Jussara
  40. Lafaiete Coutinho
  41. Lajedo do Tabocal
  42. Licínio de Almeida
  43. Livramento de Nossa Senhora
  44. Malhada de Pedras
  45. Manoel Vitorino
  46. Maraú
  47. Medeiros Neto
  48. Mulungu do Morro
  49. Pé de Serra
  50. Pilão Arcado
  51. Piripá
  52. Planalto
  53. Poções
  54. Ponto Novo
  55. Remanso 
  56. Rio de Antônio 
  57. Santa Luzia 
  58. Santa Inês
  59. Santa Rita de Cássia
  60. São Domingos
  61. São José da Vitória 
  62. Sento Sé 
  63. Simões Filho 
  64. Sobradinho 
  65. Souto Soares
  66. Terra Nova
  67. Uauá
  68. Ubatã
  69. Utinga
  70. Várzea Nova
  71. Vera Cruz 
  72. Wagner 

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