//CNN Brasil
Eu não preciso te perguntar se você que tá lendo tem uma conta numa rede social. Eu sei que você tem. Eu não conheço absolutamente ninguém que não seja minimamente ativo em pelo menos uma delas. Se você tem alguém assim na sua lista de contatos, parabéns… você conhece uma pessoa que é exceção à regra num país que é o terceiro no mundo em tempo médio gasto por usuário nas redes sociais. Quem mostra isso não é a minha bolha pessoal, são os números.
Cada perfil brasileiro fica mais de 3 horas e meia por dia, por exemplo, em TikTok e Instagram. Esse último, sozinho, tem 135 milhões de perfis brasileiros. Só aí já dá pra entender bem que rede social é uma coisa que faz parte demais do nosso cotidiano.
O problema é que, segundo uma pesquisa da Reuters, 64% da nossa população usam essas redes pra se inteirar sobre o que tá acontecendo no mundo, ou seja, essas plataformas ganharam um protagonismo muito grande na distribuição de informações e na educação de uma parte extremamente considerável da nossa massa. E, como a gente bem sabe, nem todos esses milhões de perfis disponíveis tão fazendo posts responsáveis ou verdadeiros. A gente vive sim uma pandemia (porque não é um problema exclusivamente nosso) de notícias falsas e usuários que mais querem confundir que explicar, em troca da realização de interesses próprios ou de grupos específicos.
É por isso que o tempo todo a gente vê tretas virtuais indo parar em cortes físicas. Você deve lembrar da treta entre o Alexandre de Moraes e o Elon Musk, que é dono do X (que pra mim ainda é Twitter). Um decidiu que era preciso derrubar contas com suposto teor golpista e conteúdo falso, o outro dizia que isso era uma censura absurda e inadmissível. Isso escalou tanto que virou notícia no mundo todo, o que só aumentou ainda mais a nossa já bizarra polarização política. Mas não é só um único ministro que tá de olho nisso. A questão é tão do nosso judiciário todo que o Supremo Tribunal Federal tá nesse momento discutindo se aprova mudanças nas regras do funcionamento das redes e a responsabilização ou não das plataformas pelos conteúdos que os usuários postam.
Hoje como é que funciona? Cada perfil posta o que quiser e, se a justiça mandar algum conteúdo ser retirado do ar, as plataformas só são penalizadas se não cumprirem essa decisão (justamente o que o Elon Musk tentou fazer, descumprir uma decisão judicial pra derrubar perfis). Atualmente, as plataformas só bloqueiam o acesso ou impedem postagens, por exemplo, em casos de nudez, sexo ou violação de direitos autorais. o julgamento que tá rolando agora vai decidir se as redes vão precisar decidir se tiram também outros tipos de conteúdo do ar e que conteúdos seriam esses (os com informações falsas, por exemplo) pra evitar multas ou penalidades.
Eu super entendo a necessidade de discutir regras melhores de moderação e um acompanhamento mais eficiente do que se discute massivamente na internet. Mas será que transferir integralmente pras donas das redes a responsabilidade sobre os conteúdos dos posts é mesmo o melhor caminho?
Pensa junto comigo. Se eu tenho um cachorro muito bravo, que eu sei que pode morder os outros na rua e adestrar não é algo que eu vou conseguir fazer a curto prazo, quais opções reais e imediatas eu tenho? Basicamente duas: ou só ficar com ele dentro de casa ou sair com ele de focinheira. Com a Meta, por exemplo, que é dona do Instagram, é provável que aconteça algo parecido. Se ela correr o risco de ser penalizada pelo que um usuário postar, a tendência é que ela diminua (e muito) os furos da peneira por onde passam posts feitos por 135 milhões de perfis. É impossível moderar com humanos os conteúdos que todos eles produzem. Esse trabalho vai ter que ser feito com a ajuda da tecnologia e com bots de inteligência artificial, que trabalhariam preditivamente analisando o que poderia ou não ser um potencial risco de multa pra plataforma. Nessa toada, logicamente, muita coisa seria barrada de forma errada e/ou injusta. Imagina a quantidade de reclamações, de acusações de censura prévia e coisas do tipo?! A intenção pode até ser legítima, mas esse tipo de solução pode reforçar ainda mais os argumentos de cerceamento da liberdade de expressão por parte de qualquer lado que seja das discussões.
E voltando à metáfora do cachorro bravo, quem late com más intenções nas redes sociais não é, teoricamente, um animal irracional. É claro que seria bastante difícil responsabilizar judicialmente todos os perfis que infringem a lei de alguma forma (até mesmo porque muitos nem tem CPF’s bem definidos por trás), mas pensar nisso não seria um caminho mais lógico, que faça um espalhador de fake news pensar duas vezes antes de sair destilando asneiras on-line?! Pelo menos garantir e checar a identidade dos usuários de um jeito mais efetivo não parece um pouco mais racional e viável?!
Eu não sou absolutamente ninguém pra fingir que tenho a bala de prata pra resolver um problema tão complexo, longe disso. Mas só acho que jogar a responsabilidade integralmente pras plataformas, como tem-se discutido, me parece uma solução um tanto quanto simplista pra um desafio bastante espinhoso. E outra… com esse tipo de solução, pra mim, os cachorros agressivamente racionais no canil das redes sociais vão continuar assustando. Porque eles podem até passar a usar focinheira, mas vão seguir andando na rua sem coleira.